Em meados de 2008, se pudesse espiar o futuro para saber como será o ambiente político em 2014, o eleitor petista teria certa dificuldade em acreditar nas notícias da última semana. Falo em 2008 porque, naquele ano, o PT se unia em torno da candidatura de Marta Suplicy para voltar à Prefeitura de São Paulo. O adversário a ser batido era Gilberto Kassab, candidato do DEM apadrinhado pelo arquirrival petista José Serra (PSDB).
Marta saiu derrotada da eleição - o que, de quebra, enfraqueceu a possibilidade de ser lançada candidata ao governo paulista dali a dois anos. Desde então, muita coisa mudou. Parte da cúpula do primeiro governo Lula está presa, entre os quais José Genoino e José Dirceu. Muitos saíram do partido. Marina Silva, que deixara o Ministério do Meio Ambiente em 2008, para em seguida se filiar ao PV logo, se afastou tanto do ponto de origem que, seis anos depois, numa conversão inimaginável, entrava de cabeça na campanha de um candidato tucano à Presidência. As ironias: Maria, a ambientalista, agora é inimiga, e Katia Abreu, a ruralista, amiga.
Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil, foi ungida candidata pelo presidente Lula à sua sucessão e se tornou presidenta da República. O PT retomaria a prefeitura de São Paulo somente em 2012, mas não com Marta: o escolhido foi o então desconhecido Fernando Haddad. Haddad, como Dilma, era chamado pelos opositores de “poste” de Lula, numa crítica ao fato de que qualquer indicado pelo ex-presidente venceria qualquer eleição.
Marta, que não era poste, foi eleita senadora em 2010 em um quase voo solo, mas logo foi nomeada ministra da Cultura como recompensa pelo empenho na reta final da campanha do futuro prefeito paulistano. Ela dividiria por pouco tempo a bancada petista no Senado com o ex-marido Eduardo Suplicy. Após 20 anos no cargo, ele não conseguiu se reeleger em 2014. Perdeu a vaga para o ex-governador José Serra (PSDB), que para se eleger senador teve de bater o ex-afilhado político Gilberto Kassab.
O que poucos apostariam em 2008 é que Kassab, num ato de rebeldia, sairia por aí reunindo apoio para montar o seu partido próprio, o PSD, e se tornaria aliado de primeira hora do governo federal. Tanto que a presidenta petista, que já disse não falar em nome do PT, mas do governo, não poupa elogio ao ex-adversário. Kassab também é só elogios a Dilma Rousseff. Marta, por sua vez, é pura mágoa: mal encerrada a campanha, ela aproveitou a viagem da chefe ao exterior para deixar em sua mesa uma carta de demissão. Na despedida, desejou “luminosidade” à presidenta que até ontem era chamada pelos opositores de “poste”: “Todos nós, brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país”.
Em 2014, a profecia do beato que dizia que o sertão viraria mar e o mar viraria sertão parecia cumprida. A seca na terra da garoa soa como alegoria para uma época de metamorfoses. Mas governar é fazer escolhas, e fazer escolhas exige perdas. Sem espaço no governo, Marta, ao que tudo indica, está de saída do partido. Sua proximidade com o ex-presidente Lula talvez não o convença a desistir de lançar Fernando Haddad à reeleição em São Paulo. Se isso acontecer, não estranharia se, a partir de agora, a ex-prefeita seguisse o caminho já traçado por Marina Silva, Luiza Erundina, Heloisa Helena e outros antigos ícones do partido em direção à oposição.
Do Yahoo - Por Matheus Pichonelli*Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
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