Marina Silva no velório de Eduardo Campos (Foto: Alex Silva/ Estadão Conteúdo) |
Circula na internet uma foto da ex-senadora Marina Silva olhando com um meio-sorriso em direção a um dos filhos de Eduardo Campos enquanto o corpo do ex-governador era velado no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo de Pernambuco, no domingo, 17 de agosto.
O registro, captado em uma fração de segundo em uma cerimônia que durou o dia inteiro, dizia exatamente o que parecia dizer. Nada. Mas, como se não houvesse tristeza suficiente no drama de amigos e familiares, quem acompanhou o evento pelas redes sociais tratou de usar a imagem para expandir a crônica de uma velha tragédia, tão destrutiva quanto lamentável. Vestidos de fiscais de sentimento humano, esses internautas passaram a medir com uma métrica confusa o caráter das figuras públicas presentes à cerimônia.
Ao longo do dia, as redes sociais se transformaram em um festival de atrocidades praticadas a céu aberto, movida em parte pelo pior tipo de jornalismo – o jornalismo marrom. Alguns chegaram ao ápice de sugerir uma distância, moral e humana, entre a ex-senadora e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao cravar no título: ele chorou, ela sorriu. O que isso quer dizer é um desafio para estudiosos da semiótica. Não é o meu caso, mas faço coro a alguns amigos que, de prontidão, trataram de remar contra a maré em um dia naturalmente triste, tornado ainda mais triste em meio à propagada desonestidade intelectual – aquela capaz de colocar um drama humano a serviço das próprias convicções.
Um professor de ciência política com quem mantenho contato foi o primeiro a manifestar que alguma coisa estava pobre no reino de Zuckerberg: “O debate será o fato de a Marina ter dado uma risada e o Lula chorado? É isso?”
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Outro amigo, o jornalista Mauricio Savarese, reagiu em alto e bom som: “Sobre a foto da Marina sorrindo de soslaio em um momento aleatório de um velório no qual passou umas 10 horas: se você acha que ela está feliz pela morte do seu colega de chapa, você é um idiota”.
E foi o Fernando Vives, meu vizinho de coluna aqui no Yahoo, quem sentenciou: “O funeral do Eduardo Campos mostrou uma nova classe na nossa sociedade: o sommelier de dor alheia. ‘Mas a Marina Silva sorriu’, ‘mas os filhos dele fizeram tal coisa’. Cada vez mais acredito que o Brasil, por ser um país adolescente, tem, na média, cidadãos que se comportam como tal. Lançar regra na dor alheia configura falta de caráter. E as redes sociais estão aí pra lembrar que aquela tia tosca que passa a ceia de Natal falando bobagens está por toda parte, o tempo inteiro, vomitando na nossa cara o legado da nossa miséria, pra usar a expressão do Machado de Assis. Já não sei como lidar com isso.”
Não sabemos, Fernando. E nada, no horizonte próximo, aponta qualquer esperança de mudança no discurso fratricida que tomou conta do cenário político e atingiu em cheio corações e mentes de parte de seus eleitores, cada dia mais afundados no próprio ódio e incapazes de sinalizar bom senso quando a vida pede apenas respeito e solidariedade.
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Do Yahoo - Por Matheus Pichonelli | Matheus Pichonelli
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