Foto: Reprodução / Divulgação
O carro do microempresário Fábio Apolinário, 39, percorre as ruas da periferia do Recife com uma bandeira do Brasil estendida na parte traseira. Eleitor de Lula em 2002 e 2006, ele faz parte de um contingente de 7,7 milhões de nordestinos que votou em Jair Bolsonaro (PSL) neste primeiro turno desta eleição.
O candidato do PSL, que acabou o primeiro turno com 26% dos votos válidos no Nordeste contra 51% de Fernando Haddad (PT), avançou nos grandes centros urbanos da região e venceu em 42 cidades nordestinas, incluindo cinco capitais: Recife, Maceió, Natal, João Pessoa e Aracaju.
Para este segundo turno, a palavra de ordem do candidato do PSL é mirar o interior dos estados do Nordeste, conquistar aliados e tentar ampliar a votação na região. Por outro lado, a equipe de Fernando Haddad atua para fazer um trabalho de contenção e impedir que tradicionais eleitores petistas migrem para o capitão da reserva.
Em quatro anos, houve um aumento do eleitorado antipetista no Nordeste. Em 2014, Aécio Neves (PSDB), principal opositor da candidatura de Dilma Rousseff (PT), teve 4,2 milhões de votos na região e venceu em apenas duas cidades -Campina Grande (PB) e Buerarema (BA).
Pernambuco, terra do ex-presidente Lula, que sempre consagrou nacionalmente os candidatos do PT nas urnas, é um bom exemplo para medir a diferença entre 2018 e as eleições anteriores.
Bolsonaro, apesar de ter perdido para Haddad (48,87% x 30,57%) no estado, conseguiu vencer a disputa nos cinco maiores colégios eleitorais: Recife, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista e Caruaru.
O resultado mostra que, dos 1,14 milhão de votos que o candidato do PSL obteve em Pernambuco, a grande maioria, 884.828 mil votos, veio justamente dos 10 municípios pernambucanos com maior número de votantes.
Por outro lado, nas dez maiores cidades pernambucanas, Haddad conseguiu apenas 773.794 mil dos 2.309.104 votos obtidos no estado. Em Nova Descoberta, na Zona Norte do Recife, o ambulante Fábio Sebastião de Almeida, 41 , é eleitor de Lula e não sabe explicar direito por que vai votar em Bolsonaro.
"Não conheço direito, mas vou votar nele mesmo porque é diferente. Se ele não prestar, a gente tira depois", resume. Ele não votou no primeiro turno porque, no sábado, um dia antes das eleições, o filho de 17 anos foi assassinado.
"Mataram a tiros aqui mesmo no bairro. Violência está muito grande. Tem que mudar", conta, sem saber explicar o que o seu candidato propõe para diminuir o número de homicídios.
Vizinho à casa do ambulante, Fábio Apolinário, 39, dono de um mercadinho, colocou uma bandeira do Brasil na Kombi que usa para fazer entregas. "Aqui é Bolsonaro. Eu não acredito nessas mentiras que contam sobre ele. Não acredito na televisão. A verdade está aqui", diz, apontando para o seu celular.
Fábio faz questão de dizer que sempre votou no ex-presidente petista: "Eu confesso que se Lula fosse o candidato hoje, eu pensaria em votar nele. Mas o que é certo é que ele não é candidato e, por isso, vou votar em Bolsonaro para tentar mudar as coisas que estão aí".
A empregada doméstica Maria José Gomes, 62, que foi ao mercadinho de Fábio comprar verduras, escuta a conversa e retruca. "Eu votei em Lula no primeiro turno. No candidato dele, digo. Vejo muita gente aqui dizendo que vai votar nesse Bolsonaro. Esse povo tem memória curta. Só prosperaram por causa de Lula. Como se vota em um maluco, meu deus?", questiona.
Depois de avançar nas capitais nordestinas, Bolsonaro modulou o discurso para tentar chegar aos grotões. As duras críticas do passado ao Bolsa-Família foram guardadas.
Nesta quarta-feira (10), gravou um vídeo no qual promete que vai conceder um 13º salário aos beneficiários do programa. A promessa é a mesma do governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), apoiador de Haddad, reeleito no primeiro turno.
Para o deputado federal eleito Heitor Freire (PSL-CE), as inserções e o horário eleitoral na televisão vão ajudar Bolsonaro a levar seus discursos aos eleitores da zona rural das cidades nordestinas. "Infelizmente, no interior, o acesso a internet ainda é difícil. Sou de Juazeiro do Norte e conheço bem essa realidade. Sei que é muito mais difícil a nossa mensagem chegar pelas mídias sociais", afirma.
Outro trunfo é o apoio de prefeitos que estão na oposição ao PT, já que os todos os governadores eleitos da região apoiam Haddad. Só na Bahia, estão com Bolsonaro prefeitos de cidades importantes como Camaçari, Barreiras, além do prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM).
Em Pernambuco, o prefeito de Garanhuns, cidade natal do ex-presidente Lula, também anunciou apoio ao candidato do PSL: "Ele é o único que está dizendo o que o Brasil precisa ouvir", disse Isaías Régis (PTB), durante um comício pouco antes do primeiro turno.
Túlio Velho Barreto, cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, aponta alguns fatores que podem explicar a crescida de Bolsonaro nos grandes centros urbanos nordestinos.
"Nestes locais, há uma dependência menor de políticas sociais implantadas pelo Estado. A renda maior está nas capitais. Há ainda maior acesso às redes sociais, ferramenta bastante usada por Bolsonaro", ressalta.
Ele alega também que o discurso aparente de endurecimento contra criminosos tem maior aderência em cidades maiores. "Os centros urbanos são mais suscetíveis a esse discurso. A fala mais dura em relação à violência, mesmo que não tenha conteúdo, sensibiliza mais as cidades que têm uma maior vulnerabilidade", diz.
Para Julian Lemos (PSL), que coordena a campanha de Bolsonaro no Nordeste e elegeu-se deputado federal, a votação do capitão da reserva na região não foi uma surpresa.
Ele replica o discurso de que o eleitor está em busca de novidade e o coloca como exemplo: "É a primeira vez que me candidatei a deputado e fui eleito com 71 mil votos. Sou apenas um cidadão comum que pegou ar [ficou nervoso], como a gente diz aqui, com tudo isso que está aí."
Do Portal Bahia Notícias/por João Valadares e João Pedro Pitombo | Folhapress
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