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terça-feira, 3 de março de 2015

Crise na saúde na BA: Corpo é colocado em banheiro onde pacientes tomam banho no Hospital Roberto Santos

Com problemas de hérnia de disco e úlcera, seu Jarbas*, 67 anos, está internado em uma das muitas macas amontoadas nos corredores do Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) e precisa da ajuda de uma familiar para se higienizar no banheiro da unidade, que fica próximo à segunda porta da Emergência Adulto.

No domingo, quando a parente levou  seu Jarbas para o banho, teve uma surpresa. “Tinha um paciente morto!”, contou Ana*, a parente do idoso.  Do lado esquerdo da entrada, sobre uma maca, havia um cadáver, coberto com um lençol descartável. E essa não foi a única vez que seu Jarbas teve que se limpar com o corpo como companhia.  “Hoje (ontem) de manhã foi a mesma coisa”, desabafou Ana*.

O sanitário é usado por muitos dos pacientes internados improvisadamente nos corredores. O aposentado Pedro Santos Mota, 61, viu a mesma cena ao levar a irmã, uma dona de casa com um tumor na cabeça, para tomar banho.

“Isso, claro, põe em risco o próprio paciente, a depender da condição em que a pessoa veio a falecer. Além do desrespeito com o próprio indivíduo que faleceu”, pontuou o presidente do Sindicato dos Médicos da Bahia (Sindimed), Francisco Magalhães. Apesar de o sindicato ter feito já uma série de denúncias sobre a situação do hospital, recebeu o relato com surpresa.

A assessoria do Hospital Roberto Santos confirmou que havia um cadáver no banheiro, mas alegou que a situação foi pontual, por conta de uma lotação no necrotério.

No chão
Apesar da cena assustadora, a presença de um cadáver no banheiro da Emergência é o menor dos problemas dos pacientes e de seus acompanhantes no Hospital Geral Roberto Santos.
“É um verdadeiro caos”, resume Sara Mota*, sobrinha de Pedro Mota, que passa o dia na unidade com a mãe. A mulher já fez todos os exames, mas aguarda uma cirurgia para retirar um tumor na cabeça, conforme recomendação do próprio médico do hospital.

“Eu cheguei aqui ontem (domingo) 8h, fui conseguir uma cadeira para minha mãe às 15h. Depois, ela perdeu a cadeira e teve que jogar um lençol e dormir no chão. Ela tem a bacia fraturada, são oito pinos na bacia”, disse Sara*.

Ela se reveza com o tio para cuidar da mãe, já que não há lugar para acompanhantes no hospital. “Eu disse para o médico que a gente espera, porque não tem jeito, mas espera com dignidade”, exigiu.

Superlotação 
Mesmo tendo que ficar no corredor, quem consegue uma maca já está bem mais confortável do que os outros,  que lutam por uma poltrona ou até mesmo por uma cadeira plástica. É tanta gente pelos corredores que, questionada sobre quantos seriam, a Secretaria Estadual da Saúde (Sesab) respondeu:

“Não temos como lhe dizer quantos pacientes estão no corredor, mesmo porque isso muda a todo momento. O mais importante é que a unidade não rejeita paciente, atende a todos”.  A nota diz ainda que  “o secretário Fábio Vilas-Boas está atento e providenciando solucionar os problemas da unidade”.

Em janeiro deste ano, a Sesab admitiu que 93 leitos do hospital estavam bloqueados por problemas estruturais e déficit de pessoal. A  Sesab não respondeu se a situação foi sanada.

Os acompanhantes dos pacientes contam que, nesse cenário, uma ida ao banheiro ou uma conversa com um médico significa, muitas vezes, perder o lugar. “O pobre que chega aqui sem um acompanhante morre”, afirma Ana Souza*.

Ex-presidente e hoje membro do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado da Bahia (Sindsaúde), Inalba Fontenelle destaca que o amontoado de pacientes aumenta os riscos para quem está internado. “Não tem privacidade. O profissional não pode fazer todos os tipos de procedimentos, corre o risco de alguém passar e tombar. Além disso, nem todos os corredores têm tubo de oxigenação. Tem também um risco de infecção”, disse.

A falta de espaço para tanta gente se soma à carência de profissionais. Há acompanhantes que relatam precisar ir buscar a medicação, já que não há gente suficiente para ministrá-la. “Não tem luva, demora pra chegar, tem remédio que não tem na casa. A máquina da ressonância está quebrada, faltam profissionais para determinadas especialidades”, queixou-se  João Silva*.

Em nota, o HGRS nega que faltem medicamentos. Sobre a superlotação, o comunicado informa que   toda a estrutura da unidade, maior hospital público do Norte e Nordeste, não é suficiente.

“Registramos superlotação na Emergência Adulto devido à demanda altíssima decorrente, entre outros fatores, da falta de uma assistência básica eficiente, e pelo fato de o HGRS funcionar em regime de ‘porta aberta’, sem recusar qualquer paciente, e todos eles sejam atendidos, embora o perfil deste hospital seja o de emergência para casos de alta complexidade”.

macas empilhadas Em meio à carência, há macas empilhadas no setor de lavanderia, sem uso. Questionada, a Sesab não respondeu por que as macas estão nessa situação.  

No entanto, ao mesmo tempo em que se queixam das condições desumanas decorrentes da falta de estrutura, são unânimes os elogios à equipe médica por parte de quem acompanha pacientes no Roberto Santos. “Os profissionais são humanos, a  maioria tenta fazer o que pode pelos pacientes. Eles se dedicam. Mas, infelizmente, não têm recursos suficientes para cuidar dos que estão ali”, diz João Silva, que acompanha a mãe no Roberto Santos.

Investigação 
O Ministério Público da Bahia (MP-BA) informou que vai investigar as denúncias feitas pelos acompanhantes de pacientes do HGRS. A promotora Patrícia Medrado, do Grupo de Atuação na Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa (Gepam), aconselhou que os parentes das vítimas encaminhem ao MP as imagens registradas.

“A área de Saúde deve analisar tudo isso. O Dr. Rogério Queiroz (coordenador de Saúde do MP) vai apurar essas denúncias”, disse.

A promotora informou ainda que a responsabilidade do corpo no banheiro será apurada e os responsáveis pela situação podem ser afastados do cargo em uma ação de improbidade. (Informações do Correio).

Do Portal Interior da Bahia

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